The Who – Sell Out (Inglaterra, 1967)
1 - Armenia City in the Sky
2 - Heinz Baked Beans
3 - Mary Anne with the Shaky Hand
4 - Odorono
5 - Tattoo
6 - Our Love Was
7 - I Can See for Miles
8 - I Can't Reach You
9 – Medac
10 – Relax
11 - Sunrise
12 - Rael 1
13 - Rael 2
14 - Glittering Girl
15 - Melancholia
16 - Someone's Coming
17 - Jaguar
18 - Early Morning Cold Taxi
19 - Hall of the Mountain King
20 - Girl's Eyes
21 - Mary-Anne with the Shaky Hand (versão alternativa)
22 - Glow Girl
Roger Daltrey - vocais
John Entwistle – baixo, vocais e metais
Keith Moon – bateria e vocais
Pete Townshend – guitarra, vocais e órgão em "Silas Stingy"
Al Kooper – órgão
1967 foi um ano chave para o rock ‘n’ roll: toda banda que se prezava lançou um disco recheado das mais piradas experimentações psicodélicas para transcender a música que era feita até então. Substâncias alotrópicas alargadoras das válvulas de estrangulamento de pensamentos eram arroz-de-festa em qualquer sessão de composição e gravação. Foi naquele ano em que surgiram várias bandas que na década seguinte lançariam algumas das maiores obras-primas do rock progressivo, e outras tantas que só lançaram um disco, muitas vezes o suficiente para colocar seus nomes para sempre na história do rock.
Pois eis que, no meio dessa loucura toda, os ingleses do
The Who, que já haviam lançado o que para muitos, foi o primeiro disco de punk da história, em 1965, o clássico “The Who Sings My Generation”, para em seguida lançar a mini-ópera “A Little One”, era uma fábrica de singles que estava se aproveitando da sua popularidade para gravar alguns jingles para a TV e o rádio. Diante da “moda” de ser psicodélico, eles decidem fazer do seu terceiro disco uma obra conceitual, cujo tema foi justamente o consumismo.
O disco “The Who Sell Out” (The Who se vende), irônicamente, não foi um sucesso de vcndas. Nem o único single do disco, a espetacular “
I Can See For Miles”, alcançou o sucesso esperado. Apesar disso, trata-se indiscutivelmente de um dos discos mais importantes desse pirado ano de 1967.
Escutar esse disco é como escutar uma rádio pirata, com vinhetas da Radio London e trechos de jingles, alguns não autorizados e que acabaram gerando alguns processos contra a banda. Mas o que aumenta a impressão de se estar ouvindo uma rádio é principalmente a criatividade das composições, tão diferentes umas das outras que dão a nítida impressão de que as músicas não foram tocadas pela mesma banda.
Mas analisemos o disco musicalmente e independentemente de toda essa onda psicodélica que imperava na época. A abertura, com “
Armênia City in the Sky”, feita por um empregado e motorista de Pete Townshend, lança mão de afiadíssimos efeitos de guitarra que já deixam bem claro que o que está para se ouvir é um disco de rock psicodélico, e dos bons! Depois da estranhíssima "
Heinz Baked Beans", feita para um comercial de feijões, temos a extraordinária canção acústica "
Mary Anne with the Shaky Hand". Depois da não menos que excelente “
Odorono”, nome de um revolucionário desodorante feminino (o primeiro fabricado especificamente para mulheres), mais um grande clássico: “
Tattoo”, executada regularmente em shows nos anos seguintes. “
Our Love Was” é um exemplo perfeito de canção romântica rockeira, que precede a supracitada “
I Can See For Miles”, certamente um dos pontos altos do disco, a bateria cavalgante e incansável de Keith Moon, a pesadíssima linha de baixo de Entwistle, a guitarra econômica e precisa de Pete Townshend, e o vocal épico do Roger Daltrey, tudo funcionando na mais perfeita harmonia, uma música única e absolutamente perfeita! “
I Can’t Reach You” é uma canção típica “thewhoana”, simples mas ótima; “
Medac” é mais uma vinheta de John Entwistle, “
Relax” e “
Silas Stingy” são dois belos exemplos de como Townshend, além de um excepcional guitarrista, também manda muito bem no órgão. A emocionante “
Sunrise” é uma lindíssima balada que quase ficou de fora porque não agradou a Keith Moon, e em seguida temos a mini-ópera “
Rael”, uma pequena amostra do que viria no disco seguinte, “Tommy”. “
Melancholia” é uma balada tão bela quanto a “
Sunrise”, mas ainda mais triste; “
Someone’s Coming” é uma ótima composição de Entwistle que é um exemplo perfeito do uso de metais em canções rock ‘n’ roll. “
Jaguar” conta com Keith Moon nos vocais, e é impressionante o modo como a bateria se encaixa no riff de guitarra, uma música pesadíssima para a época, assim como a instrumental “
Hall of the Mountain King”, repleta de risadas demoníacas e uivos fantasmagóricos. O disco ainda conta com “
Glittering Girl”, canção típica sessentista, e “
Girl’s Eyes”, composição de Keith Moon, mais típica ainda – e tudo isso intercalado com vinhetas de rádio e trechos de singles, com destaque para “
Top Gear”, no final de “
Rael 2”, e do pesadíssimo jingle da Coca-Cola no final de “
Glittering Girl”.
“The Who Sell Out” pode ser definido como um disco comercial sim, já que naquele ano ser experimental significa “se vender”, mas o fato de ele escancarar essa intenção mostra que os caras além de muito talento, tinham senso de humor. O instrumental que predomina é o agressivo, pesado, proto-heavy e absurdamente técnico, mas os vocais em sua maioria são tipicamente sessentista, Roger Daltrey ainda não havia descoberto a potência máxima do seu vocal, e esse paradoxo é o que dá uma sonoridade única para esse disco que é com certeza uma das obras mais importantes da história do rock ‘n’ roll, mas que acabou sendo ofuscada pelo lançamento do mega-clássico “Tommy”, em 1969 – que é sim uma obra maior e mais pretenciosa, mas nada que desmereça esse “Sell Out”, um disco indispensável para se entender um pouco do que foi fazer rock no psicodélico e transcendental final da década de 1960.